Biblioteca Rachel de Queiroz

A Biblioteca Rachel de Queiroz está de volta ao seu torrão natal. Após 10 longos anos distante do povo e da terra que tanto lhe deram inspiração para obras maravilhosas, a Biblioteca da escritora retorna ao Ceará. Graças à parceria entre a Fundação Edson Queiroz e o Instituto Moreira Salles (IMS), no Rio de Janeiro, a valiosa biblioteca de Rachel de Queiroz, composta de 3.063 itens, sendo 2.800 livros e 263 periódicos, ficará à disposição de pesquisadores e do público em geral em dois espaços da Universidade de Fortaleza (Unifor): a Biblioteca Central e a Biblioteca Acervos Especiais.
A reitora da Unifor, professora Fátima Veras, explica que o acervo foi adquirido pelo IMS em 2006 e desde então ficou abrigado na sede do instituto, na Gávea, Rio de Janeiro. “A ideia da transferência desse acervo, da coordenadora de Literatura do IMS, a escritora Elvia Bezerra, foi prontamente acolhida pela Unifor e rapidamente formalizamos a doação”, acrescenta. O acervo, já devidamente catalogado e despachado do Rio de Janeiro por via terrestre, deverá chegar a Fortaleza nesta segunda-feira, 9. A expectativa da Unifor é que ele já esteja à disposição dos interessados em fevereiro, coincidindo com o reinício das aulas.
Para a reitora Fátima Veras, a iniciativa da Unifor e IMS se reveste da maior importância na medida em que permite o acesso dos cearenses a um acervo de valor histórico inestimável e de grande relevância para a pesquisa e preservação da literatura brasileira. “É com misto de orgulho e satisfação que trazemos a biblioteca de Rachel de Queiroz para os cearenses. Na Unifor, ela se unirá a outros grandes e importantes acervos, mas certamente esta biblioteca receberá carinho especial de alunos, professores e colaborares da universidade e do público em geral por toda a sua relação com a história de todos nós, cearenses”, salienta.
Elvia Bezerra, do IMS, diz-se bastante feliz com a doação da biblioteca, apesar de ter que se desfazer de um acervo tão valioso. O motivo é também de ordem natural e afetiva. Isso porque Elvia é cearense da gema. Natural de Mombaça, “bem pertinho de Quixadá”, terra natal da autora de O Quinze, Elvia acha mais do que justo que Rachel de Queiroz retorne para o seu estado e, claro, para mais perto de sua fazenda, Não Me Deixes. “Rachel de Queiroz dormiu de rede até a sua morte, conservou o sotaque cearense e se manteve fiel às raízes ao longo da vida. Por todos esses motivos, e por considerar que os pesquisadores cearenses se beneficiarão do acesso aos livros, não houve nenhum empecilho para a concretização da doação. A ideia da transferência da biblioteca foi submetida ao Conselho de Acervos do Instituto Moreira Salles, que rapidamente a aprovou”, ressalta.
Elvia relembra com carinho a visita que fez a Rachel em 1993, em seu apartamento no Leblon. “Fui entrevistá-la para a redação de um ensaio sobre Manuel Bandeira, de quem era amiga. Ela me recepcionou com um sorriso acolhedor e me mostrou, emoldurado na parede, o original do ’Louvado para Rachel de Queiroz', que o poeta lhe tinha dedicado. Ao nos sentarmos para dar início à entrevista, me deu um branco terrível, mas, graças a Deus, logo a conversa deslanchou e fluiu, muito gostosamente”, relata, rindo. O ensaio sobre Rachel de Queiroz foi publicado em 1995, com outros dois, sobre o poeta Ribeiro Couto e a psiquiatra Nise da Silveira, no livro A trinca do Curvelo.
Depois, já em 2009, Elvia voltaria a ter novo contato com a obra de Rachel de Queiroz. Ela foi responsável pela organização e pelo prefácio do livro 'Mandacaru', que reuniu 10 poemas escritos por uma Rachel ainda menina, antes mesmo de se aventurar no romance. “Foi uma homenagem linda no centenário de nascimento de Rachel de Queiroz, comemorado em 2010”, informa. Segundo Elvia, os poemas desses livro são fundamentais para se entender a extraordinária prosadora que surgiria em ‘O Quinze’, dois anos depois. “Toda a temática do romance fermenta ali, nos versos de ‘Mandacaru’, avalia.
A edição em facsímile do IMS traz a escrita em letra cursiva elegante da menina, além de fotografias. “No prefácio, ela se dirige aos modernistas de São Paulo e se oferece para participar do movimento”, conta Elvia. Os poemas datam de 1928, quando o modernismo já estava na sua segunda fase. Os três mil quilômetros que separam o Ceará e São Paulo atrasaram a chegada do movimento capitaneado pelos paulistas.
Mais recentemente, Elvia voltou a encontrar-se com a obra de Rachel de Queiroz, desta vez para organizar a 104ª edição de 'O Quinze', que acaba de ser publicada pela editora José Olympio, enriquecida com material inédito encontrado no arquivo da escritora.
Elvia não tem dúvida de que a Unifor tem todas as condições para manter os livros e os periódicos em excelente estado de uso e conservação. “O Instituto Moreira Salles se sente muito tranquilo quanto a isso. Conhecemos a Unifor e sabemos que a universidade é qualificada para manter o alto padrão de cuidados estabelecido pelo IMS. Trata-se de uma bela parceria”, enfatiza.
Antes de homologar a doação, o IMS submeteu a decisão a Maria Luíza de Queiroz Salek, irmã da escritora. “Visitei-a em novembro de 2016, e ela concordou plenamente com o destino do acervo de Rachel”, declara Elvia. Mesma posição teve o bibliófilo José Augusto Bezerra, presidente da Academia Cearense de Letras e dono de vasto acervo sobre Rachel de Queiroz. “Todos reconhecem que a Unifor tem condições não só de preservar mas também de difundir esse rico material de pesquisa”, salienta.
Rachel de Queiroz, motivo de orgulho para os cearenses
Após o falecimento de Rachel de Queiroz, em 2003, a família doou para o bibliófilo José Augusto Bezerra, atual presidente da Academia Cearense de Letras, parte do acervo pessoal de livros e obras autorais. Amigo da escritora, José Augusto ressalta que todas as obras de Rachel de Queiroz se complementam, dialogando entre si. “Eu já era colecionador há 40 anos quando recebi a doação da família de Rachel. O acervo dela foi dividido entre o museu Rachel de Queiroz, em Quixadá, a doação feita a mim e o que foi adquirido pelo Instituto Moreira Salles”, acrescenta.
“Acredito que a volta deste acervo é imprescindível para o Ceará e toda a sua literatura. Ter esse acervo alocado na Universidade de Fortaleza é algo muito bom não apenas para a universidade, mas também para todos que quiserem consultar Rachel. Parabéns à Unifor e ao Instituto Moreira Sales por essa decisão”, salienta.
José Augusto ressalta ainda a beleza, a inteligência e a capacidade de Rachel de Queiroz, afirmando o que a história já provou: Rachel foi a primeira mulher a entrar na Academia Brasileira de Letras, tornando-se também a primeira escritora a se destacar na literatura da década de 30 junto, a outros grandes, como Graciliano Ramos e José Lins do Rego. “Ela era uma mulher de cultura vasta. Quando participou da revista 'O Cruzeiro', produziu centenas de crônicas e matérias sobre os mais diversos assuntos ao longo de trinta anos. Rachel também foi uma das mais fecundas tradutoras do Brasil, traduzindo mais de 100 obras”, conta. Para ele, Rachel sempre será mais que uma inspiração e viverá para além de seu tempo, perpetuada em suas obras e na eterna dedicação que a mesma direcionou para o Brasil.
O secretário de Cultura de Fortaleza, Evaldo Lima, ressalta a importância de Rachel de Queiroz e a figura feminina dentro da literatura brasileira. “A Rachel é patrimônio cultural deste país. Para o nosso mais intenso orgulho, ela é cearense. Ela foi a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras e suas obras literárias são repletas de sentimentos, afeto, identidade histórica e cultural”, disserta. “A Universidade de Fortaleza reforça essa tradição histórica. Ela possui acervo fabuloso de artes plásticas e obras literárias. Eu acredito que o acervo da Rachel estará muito bem guardado e disponível para toda a população cearense e brasileira”, alega.
Preciosidades do Acervo Rachel de Queiroz
“Mafuá do malungo”: jogos onomásticos e outros versos de circunstância, de Manuel Bandeira. Editora O Livro Inconsútil, 1948.
Nota: esta edição consta de 110 exemplares em papel de linho, e foi impressa para os amigos de Manuel Bandeira, por João Cabral de Melo Neto.
“10 Romancistas falam de seus personagens”. Editora Condé, [1946].
Nota: publicação com tiragem de 220 exemplares, todos em papel imperial Ledger. O exemplar da coleção de RQ é o de número 14.
“O defunto”, de Pedro Nava. Editora Macunaíma, [1967]
Nota: Publicação com tiragem limitada de 50 exemplares assinados pelo autor e pelo ilustrador, José Júlio Calasans Neto.
“O Quinze”. Confraria dos Bibliófilos do Brasil. 1995.
Notas: Publicação com tiragem única de 250 exemplares. Sendo o de Rachel o de número 217. Ilustrada com oito gravuras de Abraão Batista.
Xilogravuras, de Lasar Segall.
Nota: Publicação com tiragem de 200 exemplares, em cartolina "Internacional" de 175 gramas, assinados por Jenny Klabin Segall, viúva do aritsta.
Primeiras edições
“O Rio de Janeiro no século dezessete”, de Vivaldo Coaracy. Primeira edição, 1965.
“Fala, amendoeir’a, de Carlos Drummond de Andrade. Editora do Autor, 1957.
“Claro enigma”, de Carlos Drummond de Andrade. José Olympio, 1951.
Dedicatórias selecionadas
Carlos Drummond de Andrade
"A Rachel de Queiroz - pra quê adjetivos? – a admiração de Carlos Drummond de Andrade, Rio dezembro de 1954".
(“Fazendeiro do ar & Poesia até agora”. José Olympio, 1955)
"A Rachel de Queiroz, não uma pedra no meio do caminho, mas um abraço amigo do Carlos Drummond. Rio, IX. 1967".
(“Uma pedra no meio do caminho: biografia de um poema”. Editora do Autor, 1967)
"A Rachel de Queiroz, com estes versos de brincadeira, a admiração - a sério - do violeiro amigo Carlos Drummond de Andrade. Rio, II.VIII.1935"
(“Viola de bolso”, novamente encordoada. José Olympio, 1955)
Graciliano Ramos
"Rachel, este livro não é meu: é nosso. O seu trabalho para arrancá-lo foi pelo menos igual ao meu, sem exagero. Diga-me uma coisa: por que é que v. não transforma em romance o 'Retrato de um brasileiro'? Seria admirável. Abraços, Graciliano. Rio, 1947".
(“Angústia”. José Olympio, 1947)
"Rachel, as histórias não prestam, mas foi necessário publicá-las. abraço, Graciliano. Rio, 1947"
(“Insônia”. José Olympio, 1947)
Manuel Bandeira
"A grande e cara Rachel mando este livro, no qual ruim é a parte de Manuel, ótima a do João Cabral. Rio, 1948."
(“Mafuá do malungo”. Editora O Livro Inconsútil, 1948)
A seleção acima é uma amostra da coleção de Rachel. A biblioteca, toda catalogada pelo Instituto Moreira Salles, poderá ser visualizada em http://www.acervo.ims.com.br/

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Futricas Fortalezenses

Tidy Odonto

Futricas Fortalezenses